Dois anos da cannabis nas farmácias: O que mudou?

Dois anos da cannabis nas farmácias: O que mudou?

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As colunas publicadas na Cannalize não traduzem necessariamente a opinião do portal. A publicação tem o propósito de estimular o debate sobre cannabis no Brasil e no mundo e de refletir sobre diversos pontos de vista sobre o tema.​

Há dois anos a Anvisa autorizou a Resolução 327, que permitiu a venda de óleos derivados da planta nas drogarias. Mas o que mudou durante este tempo?

No finalzinho de 2019 a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) autorizou a Resolução 327, que permitiu a venda de produtos derivados da cannabis nas farmácias. 

A RDC entrou em vigor três meses depois, em março de 2020. Desde então, 14 produtos já foram aprovados pela agência para a venda, embora apenas cinco estejam efetivamente nas prateleiras.

Os produtos ainda não são medicamentos, mas entraram em uma categoria nova, específica para produtos à base de cannabis. Agora, as empresas têm um prazo de 5 anos para transformá-los em remédios. 

Foto: Reprodução

Custos nas farmácias

Apesar da praticidade, os produtos são inacessíveis para boa parte dos brasileiros, pois os preços ainda são bastante elevados. 

Para se ter uma ideia, o óleo mais barato disponível nas drogarias, custa R$245,00. Valor que  pode chegar a mais de dois salários mínimos dependendo da concentração.

A farmacêutica Prati-Donaduzzi, por exemplo, foi a primeira a obter a autorização, que aconteceu um mês após a resolução entrar em vigor. 

Desde então,  já faturou R$11,5 milhões com apenas três produtos nas drogarias, de acordo com um levantamento feito pela associação de indústrias de cannabis BRCann. 

Mas se ainda não é um medicamento e é inacessível, será que a resolução adiantou?

Copo meio cheio?

Mesmo com pensamentos diferentes sobre o assunto, uma parte das pessoas que trabalham no universo canábico concordam que a resolução foi um avanço.

“Apesar da Resolução ainda não tratar de todas as possibilidades existentes em relação a utilização da Cannabis no Brasil, existindo uma enorme zona cinzenta em relação à prática diária, certo é que, ao menos, temos uma mínima diretriz sobre o tema”, ressalta Pamela Godoy, advogada que trabalha auxiliando pacientes.

Já o CEO da VerdeMed, José Bacellar, ainda comenta que os avanços da cannabis no Brasil estão caminhando para um cenário melhor e em ritmo ideal. Nem muito lento e nem muito rápido. 

Grau farmacêutico

Bacellar ainda acrescenta que a resolução é um importante passo para um mercado canábico com grau farmacêutico. Segundo ele, o Brasil é um dos poucos países onde é possível comprar cannabis nas farmácias.

Em nações como Estados Unidos e Portugal, a cannabis é vendida  como uma espécie de suplemento, por isso, não há um controle mais rigoroso sobre a concentração do extrato da planta.

“Os produtos aprovados pela RDC 327, precisam ser analisados pela Anvisa, que pode até cassar produtos que não prometem o que indicam no rótulo. Há consequências. (…) O médico também tem mais certeza do que está receitando”, ressalta. 

Foto: Reprodução

Valor

Sobre o custo alto, ele ressalta que o mercado ainda é recente e há pouca concorrência. Por isso, o valor tende a baixar de acordo com o crescimento dos clientes e o maior número de variedades de produtos nas drogarias.

Pontos negativos

Contudo, há pessoas que não enxergam as coisas do mesmo jeito. 

Segundo Sheila Geriz, coordenadora da associação Liga Canábica, a resolução possui vários pontos negativos que favorecem a indústria e distanciam o paciente da terapia canábica.

“No meu ponto de vista, não acrescentou muita coisa, não facilitou o acesso. Sobretudo para pacientes com vulnerabilidade socioeconômica”, ressalta.

Exclusão

Ela também aponta outras questões, como a exclusão de outras formas de administração e a manipulação nas farmácias.

“Há pessoas com dores crônicas, como eu, que precisam usar o óleo de forma vaporizada ou tópica. A RDC não permite nada além do óleo”, ressalta.

A coordenadora também aponta que a resolução 327 também deixou de fora a venda em farmácias de manipulação, que poderiam gerar variedades maiores de produtos com canabinoides e concentrações diferentes.  

Foto: Reprodução

Uso compassivo

Sheila Geriz também reclama do uso compassivo. A resolução diz que o médico só pode prescrever o óleo de cannabis em último caso, quando não há mais nenhum tratamento efetivo para a condição. 

“Isso é muito sério, porque existem casos em que o próprio tratamento já torna a qualidade de vida do paciente muito difícil. O próprio tratamento pode levá-lo a morte”, diz.

Ela ainda cita o exemplo do seu filho, que precisou usar dezenas de anticonvulsivantes fortes para tratar epilepsia. Ela lembra que os medicamentos que quase causaram pancreatite e hepatite medicamentosa. 

Projeto de Lei 

Atualmente há o Projeto de Lei 399/15, que busca autorizar tanto o plantio quanto uma venda mais ampla de produtos à base de cannabis no país. 

A proposta foi aprovada por uma comissão especial em junho do ano passado, e já poderia seguir para o Senado. Contudo, depois de um recurso feito por deputados da oposição, o PL voltou para a Câmara dos Deputados e espera o presidente Arthur Lira pôr em pauta.

 Segundo Pamela Godoy, daqui um tempo, apenas a resolução não vai bastar. “nasce a necessidade da aprovação de leis sobre o tema, pois considerando o crescimento exponencial do tema e da utilização da Cannabis, a Resolução 327 já se torna ineficaz”, ressalta   

Bacellar também concorda que há a necessidade de mudanças nas leis, pois segundo ele, a Anvisa não pode dar conta de tudo. “ O PL vai, de fato, é o caminho que vai regulamentar o mercado no Brasil”, completa.

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