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Histórias Reais

“A cannabis salvou a minha vida em todos os sentidos”



08/03/2022



Conheça a história da biomédica Aline, que depois de dois anos entre idas e vindas do hospital, só encontrou alívio nas dores com o tratamento da cannabis.

Em 2019 Aline começou a sentir dores na lombar que acometeu todo o seu corpo, ao ponto de ser induzida ao coma. Passou por vários hospitais e tratamentos, mas nada ajudou.

Até hoje, ela não tem um diagnóstico claro, mas foi há poucos meses que voltou a ter uma qualidade de vida.

O divisor de água foi a cannabis medicinal, que Aline passou a usar no final do ano passado. “A cannabis fez em três meses o que não fizeram por mim em dois anos”, diz. 

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Foto: Arquivo Pessoal

Começo de um problema

Em 2019 a biomédica Aline da Silva, na época com 28 anos, começou a sentir uma dor forte na lombar. Não demorou muito para a dor ficar cada vez pior e causar formigamentos nas pernas. 

Descobriu-se que o nervo ciático já estava inflamado e ela sentia choques ao pisar no chão. Em poucos dias ela já não andava mais.

“Eu já estava perdendo a sensibilidade na perna esquerda e precisei usar um cateter perto da lombar”, ressalta.

Em junho de 2020 ela começou a perder a sensibilidade dos braços também e não demorou muito para ela passar a usar fralda. 

Dores psicológicas? 

Ela foi internada em vários hospitais, como o hospital São Camilo, em São Paulo. Passou por todas as especialidades, mas ninguém chegava a uma conclusão. Os médicos ainda aumentaram as medicações contra a dor, mas parece que nada resolvia. 

Ela chegou ao ponto de tomar doses altas de morfina e até sedação para diminuir a dor. Também fazia constantes fisioterapias que aliviavam, mas não eliminavam as dores.

Chegaram a dizer até que era psicológico. “Eu cheguei a ser examinada por psiquiatras e psicólogos renomados, pois eles achavam que era coisa da minha cabeça, mas os exames sempre estavam alterados”, lembra. 

Intoxicação por opioides

Depois de tantas medicações fortes, o corpo da biomédica não aguentou e ela precisou  ir para a Unidade de Tratamento Intensivo (UTI), por causa da quantidade de opioides.

Por causa disso, Aline já não comia bem, dormia mal e já perdia a memória recente. Ela ainda  saiu do hospital por três semanas, mas neste tempo, foi parar na emergência todos os dias.

“Ás vezes eu saía de madrugada e pedia ajuda para o Uber, porque não queria atrapalhar a minha família”, diz.  

A intoxicação por opioides pode ser fatal. Só em 2018 mais de 30 mil pessoas morreram nos Estados Unidos por causa dos remédios prescritos principalmente para amenizar a dor. 

Os sintomas podem ser dos mais variados, vão desde sonolência, problemas gastrointestinais,  até confusão mental. Aline possui sequelas do uso excessivo da morfina até hoje. 

“É necessário ouvir os pacientes”

Os médicos chegaram à conclusão de que Aline poderia ter uma doença incomum chamada Neuropatia Periférica Rara associada a Radiculopatia.

Ela complementa que os profissionais, mesmo de grandes centros, não estão preparados para esse tipo de tratamento, sobretudo, investigar doenças raras. 

“Falta ouvir os pacientes. Só a literatura não ajuda, é necessário ouvi-los. É isso, inclusive, que desenvolve os estudos. Eles não estão interessados em aprender”, ressalta. 

Segundo o relatório elaborado pela The Economist Intelligence Unit, que investigou a medicina personalizada em vários países, ainda é necessário uma visão holística por parte dos médicos.

Ou seja, é necessário uma nova visão dos casos clínicos, que seja mais panorâmica e desmembrada. 

Pioras 

Por causa do isolamento, Aline estava mais reclusa, não queria falar com ninguém e começou a ficar depressiva por causa da falta de qualidade de vida. 

Para piorar a situação, em março de  2021 ela teve uma apendicite e dois meses depois, ela teve um acidente, quando caiu e rompeu o saco. 

Os remédios já não ajudavam, mas causavam confusão mental e ela não dizia mais coisas que fizessem sentido.  Um técnico de enfermagem se aproveitou da situação e a abusou sexualmente, o que causou ainda mais problemas. 

Tive muitos traumas psiquiátricos e queria sair do hospital o quanto antes(…) até hoje tenho pavor de hospital”, ressalta.

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Foto: Arquivo Pessoal

Uso da cannabis medicinal

Como biomédica, Aline já tinha um interesse sobre cannabis medicinal, tanto que já pesquisava sobre o assunto. “Mas eu nunca achei que poderia servir para o meu caso”, diz. 

Mas depois de todos os problemas causados pelos medicamentos, ela decidiu que não queria mais seguir o tratamento convencional. Chegou a buscar artigos para mostrar para os médicos que aquilo estava a “matando”. 

Em uma revisão sistemática liderada pela Harvard de 28 estudos, examinam a eficácia de canabinoides para tratar varias dores e problemas médicos, o autor concluiu que de 6 em 6 pesquisas sobre dor crônica e 5 em 5 sobre dores neuropáticas estudadas, houve uma melhora significativa nos sintomas entre os pacientes.

Tratamento inacessível

Contudo, o óleo ainda é caro, mesmo se tratando de associações. “Tentei comprar pela Abrace (associação), mas a consulta era muito cara”, ressalta. 

O tratamento canábico ainda é inacessível para boa parte dos brasileiros. Para se ter uma ideia, só um óleo de 30ml pode chegar a dois salários mínimos nas farmácias. 

Há algumas associações que também auxiliam os pacientes a obter o óleo, reduzindo o valor para até 70%, mas os custos ainda são altos. 

Isso porque é necessário fabricar o extrato da planta, que não sai barato. Encontrar um médico que indique também não é uma tarefa fácil. Segundo o último levantamento demográfico de 2018, menos de 1% dos médicos prescrevem cannabis no Brasil.

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Foto: Arquivo Pessoal

“A cannabis salvou a minha vida em todos os sentidos”

Aline foi transferida para o setor de casos raros do hospital. Foi então que uma psiquiatra concordou em receitar o canabidiol. “Fiz uma rifa para comprar um frasco”, lembra.

No finalzinho do ano passado, ela passou a fazer o tratamento canábico combinado às fisioterapias e a morfina, mas os resultados vieram de forma rápida. Após duas semanas, ela saiu da cama e já voltou a andar, ainda que de bengala.

Pouco mais de um mês depois, Aline voltou a andar sem ajuda, conforme as dores foram diminuindo. Trocou mais de 20 medicações pelo óleo em três meses e hoje ela só usa o óleo como tratamento. 

“Venci tanta coisa, depressão, ansiedade, síndrome do pânico (…) ainda sinto dor, mas a cannabis salvou minha vida em todos os sentidos e por isso estou aqui pela cannabis”, complementa.

Dedicação à cannabis

Depois da experiência, ela decidiu que iria se dedicar 100% a estudar sobre a planta. “Eu não sabia o que era a vida antes da cannabis, com dor a gente não consegue pensar”, ressalta.

Hoje ela trabalha em uma importadora de produtos à base de cannabis. Segundo ela, o seu objetivo é contribuir para um acesso maior à terapia canábica.

Aline ainda paga um valor alto pelo óleo, mas não se importa. “Hoje eu não vejo mais preço, porque as outras medicações eram muito caras e superavam o valor do CBD (…) sem contar com a qualidade de vida melhor”, ressalta.

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Tainara Cavalcante

Jornalista pela Fapcom (Faculdade Paulus de Comunicação) e pós graduanda na FAAP (Fundação Armando Alves Penteado) em Jornalismo Digital, atua como produtora de conteúdo no Cannalize, Dr. Cannabis e Cannect. Amante de literatura, fotografia e conteúdo de qualidade.