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Kika conta como a cannabis foi um ponto de virada na vida da filha que convive com o espectro autista
Cibele, hoje com 33 anos, recebeu o diagnóstico de TEA (Transtorno de Espectro Autista) aos seis. Criada em Florianópolis, não falava, tinha problemas com barulho, seletividade alimentar e era bastante agitada. Mas os seus problemas não melhoraram com o uso de medicações.
A mãe, Maria Aparecida Fire Goulart, 53, conhecida como Kika, conta que o primeiro remédio até deixou a filha mais calma. Contudo, Cibele já não era a mesma criança, estava apática e não expressava mais as emoções.
O autismo não é uma doença, mas um transtorno de desenvolvimento que não tem cura. O papel dos remédios é ajudar a aliviar algumas características, como agressividade, impulsividade e agitação.
Mas parece que nada funcionava muito bem. Na adolescência, a filha passou a tomar seis fármacos, de uma vez, o que também resultou em convulsões. De repente a família se viu em um tratamento integrativo, cortando leite, glúten e fazendo o que fosse preciso para a filha ficar bem.
Contudo, nada funcionou. “Eu cheguei ao ponto de levá-la para internações psiquiátricas por três vezes”, conta Kika.
Problema agravado na adolescência
Na infância, Cibele alcançou o que chamamos hoje de autismo com nível de suporte 1. Foi perfeitamente alfabetizada e conseguia se virar bem. Mas isso durou pouco.
Na adolescência a menina passou a tomar mais remédios principalmente para tratar a ansiedade, mas parece que nada estava ajudando.
“A gente foi tentando fazer modificações medicamentosas ao longo de 10 anos, o que só foi piorando o quadro dela. Acredito que até acabou adquirindo uma deficiência intelectual junto que impactou de uma forma muito forte. Do nível de suporte um, ela migrou para o três”, acrescenta a mãe.
Estima-se que o Brasil tenha mais de cinco milhões de pessoas com o espectro autista. Isso porque, de acordo com o relatório do CDC (Centers for Diseases Control and Prevention) uma em cada 36 crianças podem ter o espectro.
A pessoa que nasce com TEA pode apresentar níveis de suportes diferentes. Enquanto o nível de suporte um é direcionado para indivíduos mais independentes, por exemplo, uma pessoa com o nível de suporte três pode ter bastantes dificuldades de interação e até para processos cognitivos.
E sim, uma pessoa com autismo também pode transitar entre os níveis, regredindo ou progredindo.
Fundo do poço
Em 2019, depois de anos tentando encontrar medicações que pudessem ajudar nos sintomas, a família chegou ao fundo do poço. Kika sofria ao ter que internar a filha sempre que ela tinha um surto.
Durante as internações, as medicações até acalmavam Cibele, mas não a deixavam estável por muito tempo. E, segundo os médicos, o procedimento era esse. Não havia um tratamento.
Chegou a um ponto da menina não dormir mais. Kika tinha que revezar com o marido para poder cuidar de Cibele durante à noite. Como se não bastasse, Cibele também teve Esteatose Hepática por causa da quantidade de remédios que tomava.
Introdução da cannabis
Quem falou da cannabis foi a Valquíria, a filha mais nova da Kika. Na época, estudante de medicina, soube de um médico da Universidade Federal de Santa Catarina que trabalhava há anos com terapia canábica.
Com grande dificuldade, elas conseguiram um encaixe na agenda do médico e não demorou muito para Cibele começar a utilizar o óleo comprado de uma associação de pacientes.
A família conta que os resultados vieram de forma rápida. E a melhora foi impressionante. Com poucas gotinhas a menina já estava mais relaxada e no primeiro mês, já tiraram o antidepressivo. Hoje, Cibele já não utiliza mais nenhum remédio além da cannabis.
Diferente de outros medicamentos, a cannabis funciona através de um sistema único, chamado Sistema Endocanabinoide. Através de receptores ele auxilia na regulação da homeostase, ou seja, o equilíbrio do organismo.
De forma bem simples, a cannabis ajuda a controlar os sintomas por meio da regulação das funções do corpo. Se uma pessoa está muito ansiosa, por exemplo, a cannabis ajuda na estabilidade.
De acordo com uma pesquisa realizada no Hospital Universitário de Brasília e divulgada no mês passado, 70% das pessoas com autismo que participaram do estudo apresentaram melhoras com a cannabis medicinal.
O estudo acompanhou 30 pacientes com idades entre 5 a 18 anos com o diagnóstico de TEA moderado a grave. Dentre as principais melhoras observadas, houve um aumento das habilidades cognitivas, melhora da atenção e contato visual.
Além da diminuição da agressividade, da irritabilidade e um aumento da qualidade de vida.
Aprender para ser ouvida
Ao falar sobre cannabis para os médicos da filha, Kika foi taxada como uma péssima mãe. A profissional que acompanhava a Cibele a chamou de louca e ainda acusou a mãe de estar “chapando” a filha.
“Ela disse que não atenderia mais se eu insistisse (na cannabis), que o vínculo então estaria cortado. Ela não seria mais médica da Cibele, não acompanharia a minha filha porque não concordava com isso”, lembra a mãe.
Depois desse dia, Kika decidiu que estudaria mais sobre o assunto e não deixaria que mais ninguém a humilhasse novamente. Passou pelo curso da Unifesp, pela Sociedade Brasileira de Estudos de Cannabis, pelo projeto Mães jardineiras e de repente, se viu imersa no universo canábico.
Como uma genuína mãe atípica, Kika também pesquisava a fundo tudo sobre autismo. Comportamentos, processos cognitivos, formas de aprendizagem e mais. Contudo, não se sentia ouvida.
“Eu percebi que tudo que eu falava para os professores não era validado por eu não ter uma formação. Então aí eu passei a estudar, me formei e em seguida, fiz neuropsicopedagogia. Comecei a estudar cada vez mais dentro da área da neurociências e assim eu fui fazendo esses estudos ao longo da minha vida até chegar onde eu hoje eu estou”, acrescenta.
Hoje, Kika é professora de educação especial da prefeitura de Florianópolis.
Projeto de surf
Antes mesmo de conhecer as propriedades medicinais da cannabis, Kika e outras mães atípicas pensaram em alguma forma de inclusão social de crianças com autismo. O surf foi escolhido pela convivência mais próxima com o mar além das experiências sensoriais que a modalidade proporciona.
“Todos os domingos, desde 2015, a gente vem administrando aulas gratuitas de surf na praia. A associação passou por diversos momentos, desde um grupo de amigos que se reuniu e passou a administrar essas aulas em parceria com escolas de surf”, acrescenta.
Hoje, a associação chamada Onda Azul tem CNPJ, pranchas, materiais e instrutores próprios. A instituição que completa dez anos em 2025, recebeu até um convite do estado para fazer um festival de surf para pessoas com deficiência em fevereiro.
“A gente também convida as associações de cannabis aqui de Florianópolis a participar com a gente desses momentos. Tanto nas aulas quanto nos eventos que a gente faz, porque a gente sabe da importância da informação”, conclui.
Consulte um médico
No Brasil, a cannabis é aprovada apenas para fins medicinais e só pode ser comprada com receita. Atualmente, ela pode ser adquirida através de importações, nas farmácias e até por associações de pacientes.
Caso precise de ajuda, disponibilizamos um atendimento especializado que poderá esclarecer todas as suas dúvidas, além de auxiliar desde a achar um prescritor até o processo de importação do produto através da nossa parceira Cannect. Clique aqui.
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