Enquanto o STF avalia a proibição da manipulação de cannabis, a decisão pode redefinir o setor
O STF (Supremo Tribunal Federal) encontra-se em meio a um julgamento de repercussão nacional: a análise se farmácias de manipulação terão permissão para produzir e dispensar medicamentos à base de cannabis.
O recurso, impulsionado pela proibição contida na RDC (Resolução da Diretoria Colegiada) 327/2019 da Anvisa, questiona o poder regulatório da agência ao impedir a manipulação desses medicamentos, enquanto outras substâncias controladas, como opioides e benzodiazepínicos, têm sua manipulação permitida.
A decisão do STF sobre a aplicação de repercussão geral significa que o veredicto a ser dado futuramente deverá ser adotado por todas as instâncias judiciais em casos semelhantes, trazendo uniformidade e impacto significativo ao setor de saúde e ao mercado de cannabis medicinal no país.
O cenário atual revela um impasse: enquanto a Anvisa defende a exclusividade das farmácias sem manipulação e das drogarias para a venda de produtos à base de cannabis, profissionais de saúde e farmácias de manipulação argumentam que essa restrição prejudica o direito dos pacientes ao tratamento personalizado e acessível.
O relator do caso, ministro Alexandre de Moraes, já sinalizou a importância constitucional e o interesse público envolvidos no julgamento, com seu voto pelo reconhecimento da repercussão geral.
A tendência é que o STF acolha essa repercussão, conduzindo o debate para uma análise mais aprofundada dos limites do poder regulatório da Anvisa e do direito dos pacientes à saúde e à autonomia terapêutica, especialmente no uso de tratamentos naturais como a cannabis medicinal.
A proibição da manipulação de medicamentos à base de cannabis em farmácias especializadas levanta uma questão fundamental: a quem realmente serve essa restrição?
Embora a Anvisa permita a manipulação de substâncias controladas como opioides e benzodiazepínicos, a cannabis, uma planta de origem natural com comprovado potencial terapêutico, enfrenta barreiras que dificultam o acesso dos pacientes a terapias personalizadas e a custos mais acessíveis.
Esse cenário abre espaço para questionamentos sobre os reais interesses por trás da proibição.
Em 2019, a RDC 327 da Anvisa determinou que medicamentos à base de cannabis só podem ser dispensados em drogarias e farmácias sem manipulação, mediante prescrição médica.
A justificativa para essa restrição baseia-se em aspectos de segurança e controle de qualidade, mas muitos profissionais e especialistas apontam que essa diferenciação favorece a produção em larga escala pelas indústrias farmacêuticas, restringindo o papel das farmácias de manipulação, que possuem capacidade técnica para criar medicamentos individualizados, ajustados às necessidades de cada paciente.
A proibição atual impede que o paciente tenha acesso a fórmulas magistrais personalizadas, uma prática que poderia ser mais econômica e ajustada às doses e compostos específicos recomendados pelo médico.
As farmácias de manipulação têm um papel crucial ao possibilitar esse tipo de tratamento para outras substâncias controladas, ajustando concentrações e combinações conforme a demanda médica.
No entanto, ao limitar essa possibilidade apenas às farmácias de manipulação, a regulamentação brasileira deixa o paciente de cannabis restrito a opções industrializadas, que muitas vezes não atendem à variedade de condições clínicas tratáveis com essa planta.
O argumento da segurança e do controle de qualidade tem, certamente, peso relevante. No entanto, ele se mostra insuficiente quando outras substâncias de risco elevado são permitidas no sistema de manipulação.
Esse contraste traz à tona um debate mais amplo sobre a autonomia do paciente e do médico na escolha de tratamentos.
A regulamentação para a manipulação de cannabis poderia facilmente seguir os mesmos padrões de segurança já exigidos para outras substâncias controladas, como opioides, em que o controle técnico e sanitário é rigoroso, mas não impede a personalização do tratamento.
Essa proibição acaba por limitar a autonomia dos pacientes e dos profissionais de saúde em favor de uma estrutura regulatória que parece priorizar as indústrias farmacêuticas.
De fato, o custo elevado dos produtos de cannabis importados ou industrializados representa um obstáculo para muitos pacientes, e a proibição das fórmulas manipuladas priva o mercado de alternativas acessíveis.
Em última análise, o impacto dessa regulamentação se estende ao direito dos cidadãos ao tratamento digno e acessível, uma questão de saúde pública que vai além da simples preferência de mercado.
O Judiciário, agora, se encontra diante de um papel importante para determinar se essa proibição realmente protege a saúde pública ou se, de fato, impõe uma reserva de mercado que favorece exclusivamente os produtos de grandes indústrias farmacêuticas.
A decisão do STF pode, finalmente, redefinir os limites da atuação das agências reguladoras, assegurando tanto a segurança do medicamento quanto a liberdade terapêutica dos pacientes brasileiros.
Texto escrito por Eduardo Rodrigues em colaboração com GCClass
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Dra. Pamela Godoy e Dra. Taís Corrêa são sócias fundadoras do Correa Godoy Advogados, escritório especializado em Direito da Saúde, com foco no Direito Canábico. A frente também do CG Class, uma empresa dedicada a educação Cannabica, são as idealizadoras de cursos e mentorias que contam com o olhar jurídico e apurado de quem tem mais de 10 anos de experiência. Mentoras da comunidade CGCLUB, um grupo jurídico dedicado as soluções jurídicas para os desafios que se apresentam diariamente nessa jornada. Juntas, elas têm como missão garantir o direito à saúde, a livre exploração de atividade econômica, buscando a reparação social da Cannabis, fazendo dessa causa uma motivação diária para atingir todos os seus objetivos.
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