O proibicionismo da maconha está ligado diretamente ao canabinoide tetra-hidrocanabinol, bem como determina a Green List da convenção de Viena de 1971, o popularmente conhecido THC e seus derivados ainda são considerados substâncias perigosas e de controle internacional.
O tratado do qual baseamos nossa legislação tem 51 anos, ou seja, meio século.
De lá pra cá, avançamos na tecnologia e hoje, graças ao trabalho de grandes nomes da ciência canabinoide, como Dr. Raphael Mechoulam, que estudou o efeito entourage, e também o Dr. Elisaldo Carlini, um dos pioneiros no estudo da maconha e seu uso medicinal, sabemos que todos os canabinoides da planta medicinal cannabis podem ser benéficos à saúde.
O preconceito social ligado a fatores históricos em nosso país, também atinge a maconha e o meio que luta por sua liberação. Assim como o samba, a capoeira e o funk, a maconha ligada diretamente a áreas periferias é discriminada e excluída.
O fator qualidade é usado para justificar que esse tipo de maconha não deve entrar no projeto legalista nacional.
Ignoramos fatores sociais, econômicos e principalmente a população que, direta e indiretamente faz parte do ciclo da existência da erva que está presente em nosso país desde a ditadura militar.
O tipo de maconha mais consumido no nosso país abastece principalmente as duas metrópoles globais brasileiras, Rio de Janeiro e São Paulo.
Entre a selva de pedra dos negócios e o principal cartão postal do país, esse tipo de maconha se faz popular, principalmente entre aqueles que podem pagar muito pouco pela erva e que não a cultivam, pois estão a mercê do artigo 28 da lei 11.343/06 e seu parágrafo 2 que diz que leva em conta condições pessoais, sociais bem como o local para determinar se um cultivo é para uso pessoal.
Essa erva surge em nosso território nos anos 70 na ditadura militar alinhada à recém-Convenção de Viena sobre psicotrópicos gera uma forte repressão a todos os envolvidos com a planta.
Uma opção de erva compacta e barata surge através de nosso vizinho Paraguai. O prensado chega às capitais como forma de resistência aos “anos de chumbo” promovido pelos militares.
O governo militar cai em 1985 mas sua lei proibicionista só foi alterada 30 anos após a sua criação.
A maconha do Paraguai abastece todas as classes sociais até o fim dos anos 90, quando temos o novo milênio e com ele a popularização da Internet.
Quem tinha acesso, conseguia buscar através dessa nova ferramenta informações de cultivo em sites de fora do país. Assim, em 2002 nasce o primeiro fórum sobre o assunto na Internet brasileira.
Já em 2006 a lei proibicionista da ditadura militar é revogada e uma nova legislação proibicionista passa a valer porém ainda se baseia na Convenção de Viena de 1971.
A pena de prisão para usuários é extinta e o cultivo doméstico enquadrado em uso pessoal.
Mesmo com a lei contemplando o cultivo para uso pessoal, o artigo 28 não traz segurança quanto a sua autuação, a análise de inúmeros fatores.
E a falta de uma quantidade mínima para se considerar uso pessoal, desencoraja aqueles que ainda vivem às sombras da lei proibicionista, criada no período da ditadura militar.
A maconha do Paraguai continua cumprindo seu papel, só que agora muito mais ligado ao comércio de baixa renda.
Com o avanço da Internet, muitos conseguem aprender a cultivar, mas com o acesso às sementes ainda muito restrito, a primeira experiência de muitos cultivadores vem através dos “prenseeds”, sementes que vem junto com a maconha prensada.
Em 2014 iniciamos a fase das mães cultivadoras que buscavam acesso à saúde através do óleo de maconha para seus filhos.
As associações surgem bem como o óleo de canabidiol importado que juntos trouxeram uma nova fase na história da maconha no Brasil.
A erva do Paraguai se torna definitivamente um produto da população usuária baixa renda do Brasil e o cultivo doméstico e suas maravilhosas flores in natura ganham total atenção.
A substância canabidiol vira destaque, sua sigla CBD torna-se popular e nos trás junto dela muito conhecimento.
Descobrimos que a planta maconha inteira pode ser benéfica a nossa saúde e muitas pessoas passam a importar CBD para se tratar.
Agora a maconha prensada, produto de áreas pobres, passa a carregar toda a culpa pela proibição.
A luta pela legalização exclui esse tipo de maconha que surgiu como forma de resistência, mas hoje não é mais vista assim.
Plantas que geralmente são ricas em THC, o canabinoide “vilão”, mas que ainda sim contém todos os outros canabinoides e flavonoides passa a não fazer parte do projeto legalista brasileiro.
O proibicionismo é aplicado ao canabinoide e não faz qualquer distinção entre o tipo e a qualidade.
Temos como exemplo, o caso do Márcio, fundador da associação Maria Flor que promove tratamento à base de canabidiol preso e condenado injustamente por transporte de maconha medicinal.
Luta democrática é aquela que inclui todos os corpos. Nos acostumamos a assistir através da mídia sensacionalista que explora somente o proibicionista aplicado a baixa renda, a erva “vilã” é aquela ligada às minorias sociais que por fatores históricos tem tudo que é ligado a si discriminado.
A violência é culpa do proibicionista e não é um problema exclusivamente do Brasil.
Porém, usamos a violência que atinge a baixa renda como o foco do caos social gerado pela maconha e ignoramos completamente a origem proibicionista internacional que realmente gera realmente todo o caos.
Nenhum a menos na luta pela erva, desejamos um meio mais consciente à proibição internacional.
A chacina ocorrida na Chapada dos Veadeiros em Janeiro, contra cultivadores pretos e pobres, nos mostra claramente que o problema nunca foi o tipo de erva e sim o controle social.
Os rastros do Brasil império e a marginalização do povo preto se perpetuam em nossa sociedade no geral, no meio da legalização da maconha não seria diferente.
Todes têm o direito à planta livre!
As colunas publicadas na Cannalize não traduzem necessariamente a opinião do portal. A publicação tem o propósito de estimular o debate sobre cannabis no Brasil e no mundo e de refletir sobre diversos pontos de vista sobre o tema.
Maria Gabriella - GabiiWeed
Jornalista, paciente medicinal e ativista planta livre. Fundadora do GabiiWeed falo sobre racismo no meio canábico, lei sobre drogas e maconha na periferia.
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