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Prescrição de cannabis perante a lei: A teoria e a prática





Diante do cenário fático da Medicina Canábica, que hoje vem crescendo muito no Brasil, diversas são as questões legais que surgem, uma vez que, como já sabemos, a planta Cannabis ainda é considerada proscrita, ou seja, proibida.

Importante destacar que atualmente a planta e seus componentes vegetais estão sendo objeto de muitos estudos científicos e, portanto, há certas exceções à proibição quando falamos de uso da planta para tratamentos medicinais.

Ocorre que ainda não temos uma lei específica que regulamente o tema, por isso, atualmente quem define na prática as regras para o uso da medicina é a ANVISA. 

Regulamentação

No Brasil, a ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) é responsável por criar normas e regulamentos e dar suporte para todas as atividades da área no País e é também quem executa as atividades de controle sanitário e fiscalização em portos, aeroportos e fronteiras.

Em sua resolução RDC 327/2019 a ANVISA trata “sobre os procedimentos para a concessão da Autorização Sanitária para a fabricação e a importação, bem como estabelece requisitos para a comercialização, prescrição, a dispensação, o monitoramento e a fiscalização de produtos de Cannabis para fins medicinais, e dá outras providências”.

E sob esse aspecto queremos dar ênfase nesse artigo a PRESCRIÇÃO médica e todos os cenários que a envolvem.

Apenas para epilepsia?

Primeiramente cumpre dizer que a classe médica possui como órgão regulamentador de classe o Conselho Federal de Medicina CFM – órgão esse que possui atribuições constitucionais de fiscalização e normatização da prática médica.

A Lei Federal nº 12.842/013 confere ao CFM a competência para editar normas acerca de experimentos de procedimentos de medicina no Brasil.

Nessa toada, surge a resolução nº 2.113/2014, regulamentando o uso de canabidiol como forma terapêutica médica exclusiva para o tratamento em crianças e adolescentes com epilepsias refratárias, às terapias convencionais.

Apenas produtos industrializados

Ocorre que, essa mesma resolução que autoriza a prescrição para criança com epilepsias, veda a prescrição de canabidiol in natura, prática, inclusive, adotada por muitos especialistas atualmente, tendo em vista a RDC 327/2019, que conforme mencionado, autoriza a prescrição de Cannabis.

A resolução 2113/2014 diz:

Art. 1º Regulamentar o uso compassivo do canabidiol como terapêutica médica, exclusiva para o tratamento de epilepsias na infância e adolescência refratárias às terapias convencionais;

Art. 2° Restringir a prescrição compassiva do canabidiol às especialidades de neurologia e suas áreas de atuação, neurocirurgia e psiquiatria;

Parágrafo único. Os médicos prescritores do uso compassivo de canabidiol deverão ser previamente cadastrados no CRM/CFM especialmente para este fim (anexo I);

Art.  4º É  vedado  ao  médico  a  prescrição  da  cannabis  in  natura para uso  medicinal,  bem  como quaisquer outros derivados que não o canabidiol;

Ou seja, o CFM regulamentou em 2014 algumas possibilidades de prescrições, contudo, essas possibilidades estão restritas, conforme se vê nos artigos acima transcritos.

E é exatamente nesse ponto que surge a reflexão. Isso porque o CFM não se posicionou sobre o tema desde 2014 e atualmente todos os médicos estão se baseando, para prescrever a Cannabis como forma de tratamento à inúmeras doenças, na resolução da ANVISA – RDC 327/2019 que diz:

Art. 5° Os produtos de Cannabis podem ser prescritos quando estiverem esgotadas outras opções terapêuticas disponíveis no mercado brasileiro.

Art.13. A prescrição dos produtos de Cannabis é restrita aos profissionais médicos legalmente habilitados pelo Conselho Federal de Medicina.

Art. 51. A prescrição do produto de Cannabis com THC até 0,2% deve ser acompanhada da Notificação de Receita “B”, nos termos da Portaria SVS/MS nº 344, de 12 de maio de 1998 e suas atualizações.

Art. 52. A prescrição do produto de Cannabis com THC acima de 0,2% deve ser acompanhada da Notificação de Receita “A”, nos termos da Portaria SVS/MS nº 344, de 1998 e suas atualizações.

Contudo, apesar da ANVISA ter, em tese, regulamentando a forma e possibilidades de prescrição, trazendo muito mais abrangência a essas possibilidades, a ANVISA não está hierarquicamente acima do CFM. 

Isso significa dizer que, apesar da ANVISA ter regulamentado a forma de prescrição e ter definido que todos os profissionais médicos legalmente habilitados pelo Conselho Federal de Medicina podem prescrever o tratamento com Cannabis, o Conselho Federal Medicina não se posicionou oficialmente sobre o assunto desde 2014 e a última Resolução editada restringe a prescrição da Cannabis as crianças e adolescentes com epilepsia refratária e veda a prescrição in natura.

E agora?

Conclusão desse estudo é que, apesar da prática médica atualmente estar fundamentada na resolução da ANVISA para prescrever diversos tratamentos com a Cannabis, o CFM não endossou expressamente essa prática, portanto, temos uma evidente lacuna jurídica que pode eventualmente prejudicar o médico prescritor, se este não tomar os devidos cuidados.

Resumidamente, não existe hierarquia entre esses órgãos CFM e ANVISA, portanto, ainda que a ANVISA esteja regulamentando o assunto, se faz urgente o posicionamento oficial do CFM e dos Conselhos Regionais – CRM. Isso para que o médico prescritor tenha plena legalidade para exercer sua atividade.

E por sua vez, ao médico prescritor, cabe tomar todos os cuidados necessários para se resguardar de qualquer eventual alegação de prática ilegal por prescrição de planta proscrita – Lei de Drogas. 

Procure um advogado especialista para entender qual a melhor forma de continuar prescrevendo a Cannabis como forma de tratamento a seus pacientes.

Sobre as nossas colunas

As colunas publicadas na Cannalize não traduzem necessariamente a opinião do portal. A publicação tem o propósito de estimular o debate sobre cannabis no Brasil e no mundo e de refletir sobre diversos pontos de vista sobre o tema.​

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Educação Jurídica Canábica

Dra. Pamela Godoy⁩ e Dra. Taís Corrêa são sócias fundadoras do Correa Godoy Advogados, escritório especializado em Direito da Saúde, com foco no Direito Canábico. A frente também do CG Class, uma empresa dedicada a educação Cannabica, são as idealizadoras de cursos e mentorias que contam com o olhar jurídico e apurado de quem tem mais de 10 anos de experiência. Mentoras da comunidade CGCLUB, um grupo jurídico dedicado as soluções jurídicas para os desafios que se apresentam diariamente nessa jornada. Juntas, elas têm como missão garantir o direito à saúde, a livre exploração de atividade econômica, buscando a reparação social da Cannabis, fazendo dessa causa uma motivação diária para atingir todos os seus objetivos.