Ivonete Pereira Gonçalves de 39 anos e sua filha Júlia Gonçalves Tavares com quase 3, moram na cidade de Cotia, em São Paulo. A menina herdou o nanismo dos pais, no entanto, no seu caso houve algumas complicações.
Não é incomum uma criança com nanismo apresentar limitações no tórax, o que a faz respirar mais rápido e se cansar facilmente. No entanto, na Júlia, resultou em problemas respiratórios, o que a fez ficar 200 dias no hospital.
De tanto ela ser entubada, os médicos resolveram fazer uma traqueostomia para tentar resolver o problema.
Mas a Júlia também é hidrocefálica, condição que causa o acúmulo de água no cérebro. Ela precisou fazer uma cirurgia para colocar uma válvula para drenar a água direto para a urina.
No entanto, depois disso, ela começou a ter crises de epilepsia, e os pequenos avanços que fazia, foram regredindo cada vez mais.
A pequena Júlia antes de usar o canabidiol Arquivo pessoal
A epilepsia atinge o sistema nervoso que gera crises convulsivas e pode ser prejudicial para o desenvolvimento, principalmente na infância.
As crises podem afetar o processo de aprendizagem motor e intelectual. Em 50% dos casos, as convulsões desaparecem em até um ano, outros 20%, em até cinco anos.
A porcentagem restante é considerada resistente à medicamentos convencionais e pode levar a vida inteira. Ela é chamada de Epilepsia Refratária, ou de difícil controle.
O que resta para mães que ficam desesperadas com a situação quase sempre é a sedação para que as crianças não tenham crises, no entanto, são medicações pesadas e cheia de efeitos colaterais.
Era o caso da pequena Julia, Ivonete conta que a sua filha, que ainda não tem nem 3 anos, já tomava 7 tipos de remédios fortes, inclusive o Depakene, que só é recomendado para crianças acima de 10 anos e o famoso Gardenal.
Ivonete não gostava de ver a sua filha assim. Ela dormia o dia inteiro, não sorria e não mostrava uma evolução, e as crises também não passavam.
Foi há quatro meses que a própria neuropediatra falou do canabidiol (CBD), um componente isolado da cannabis que não provoca efeitos alucinógenos. “Ela alertou que o valor era alto, mas eu pensei que a minha filha só iria precisar de um frasco” ressalta a mãe.
No dia que Ivonete conseguiu a autorização de importação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) ela já comprou o óleo, através da Farmausa. O frasco do Purodiol custou R$550,00 mais RS220,00 de frete, onde ela pagou com o cartão de crédito.
De acordo com a Lei de Acesso à Informação (LAI), as solicitações para a importação de medicamentos à base de cannabis deram um salto nos últimos anos.
Só até junho deste ano (2019), foram feitos 5.140 pedidos de importação, 4.314 a mais que em do que o ano inteiro de 2015, quando a ANVISA liberou a primeira compra internacional.
Ivonete conta que os primeiros resultados vieram depois de três ou quatro dias, sua filha já sorria mais e as crises convulsivas foram diminuindo até sumir.
Três meses depois, a Julia já consegue ficar sentada por mais de uma hora, já balbucia, voltou a comer pela boca e fica acordada durante o dia.
A cannabis age no Sistema Endocanabinóide do nosso corpo, que é responsável por manter o equilíbrio de várias funções. Contudo, este sistema é complexo, e não é qualquer dosagem ou canabinóide que funciona para todo mundo.
É preciso ir testando para saber qual tipo de dosagem e qual a cepa é melhor para a genética de cada um.
A mãe conta que não precisou se preocupar com isso, pois o primeiro medicamento que comprou, que possui 100% CBD, trouxe os resultados esperados. Um alívio para o bolso da auxiliar administrativa.
Antes de começar a dar o óleo, Ivonete tentava tirar o enorme número de medicações da menina, mas as crises convulsivas sempre voltavam com mais intensidade, o que consequentemente, deixava a menina dependente dos medicamentos. “Ela não vivia, eu não achava certo deixá-la dopada o dia inteiro” completa.
Dependência que gera lucros para o mercado farmacêutico, segundo uma estimativa da revista inglesa Focus em 2016, é o negócio mais lucrativo do planeta, perde apenas para a indústria do petróleo.
O vício nos medicamentos é o mais preocupante, cerca de 56,6 milhões de caixas de medicamentos com calmantes foi comprado no Brasil só em 2018. O famoso Rivotril, por exemplo, é o segundo medicamento mais consumido no país, atrás apenas de anticoncepcionais.
Um levantamento feito pela Unicamp em 2017 mostrou que os remédios são a principal causa de intoxicação no Brasil e as crianças e idosos são os mais afetados. Situação vista também lá fora, nos Estados Unidos, por exemplo, um milhão de pessoas são intoxicadas por remédios todos os anos.
A pequena Júlia depois de usar o canabidiol Arquivo pessoal
Em apenas três meses, a mãe da Júlia já conseguiu retirar dois medicamentos fortes que a menina tomava para as convulsões sem que ela tivesse crises, Ivonete espera tirar os outros cinco até novembro.
A introdução da cannabis começa com doses pequenas e vai aumentando de acordo com a diminuição dos sintomas.
Algumas pessoas conseguem passar um ou dois meses com apenas um frasco, no entanto, outras precisam de mais. Tudo vai depender de como o organismo vai absorver o extrato da planta.
Apesar do pai da menina ser presente na vida da filha, a auxiliar administrativa é mãe solteira. Por isso, ela pretende entrar com um pedido de custeamento do Purodiol pelo Sistema único de Saúde (SUS).
Devido à pandemia de Coronavírus, ela ainda não conseguiu fazer todos os trâmites. No entanto, a mãe teme que sem o CBD, a filha volte a ter convulsões.
Ela também tentou pelo convênio, mas recebeu duas negativas. Segundo a advogada Ana Izabel Carvana de Hollanda que trabalha com processo contra planos de saúde, os convênios são sim obrigados a cobrir a medicamentos à base de cannabis, pois eles são autorizados pela ANVISA.
No entanto, para conseguir, é necessário entrar com uma ação que leva pelo menos, dois anos.
Ivonete sabe que há óleos artesanais vendidos em grupos do whatsapp e redes sociais, mas conta que nunca quis que nada fosse ilegal, tanto pela segurança da filha, quanto pela sua própria.
No entanto, a mãe sabe que não pode custear a medicação todo mês. Por isso, seus amigos a convenceram de fazer uma vaquinha online, onde ela colocou a média que gasta por ano (um total de R$46.200,00).
Até o momento, a campanha “Todos Pela Pequena Juju” já tem mais de R$12 mil reais.
Só no site Vakinhas.com.br, são 28 vaquinhas com a palavra “cannabis” ou “canabidiol”, onde famílias pedem ajuda para custear os tratamentos, fora as pessoas que só colocaram na descrição.
Ivonete não esperava tanto dinheiro, para ela, se a vaquinha resultasse em apenas R$100,00 já faria a diferença.
Ivonete já enfrentava preconceito por ser anã, mas agora, percebeu que a cannabis também causa olhares.
Desde que a Júlia era pequena, a mãe documentava os seus avanços nas redes sociais. Foi depois que ela começou a falar sobre o canabidiol que as curtidas e comentários diminuíram e ela perdeu seguidores.
https://www.instagram.com/p/CCnp06spH-O/
Tainara Cavalcante
Jornalista pela Fapcom (Faculdade Paulus de Comunicação) e pós graduada na FAAP (Fundação Armando Alves Penteado) em Jornalismo Digital, atua como produtora de conteúdo no Cannalize, Dr. Cannabis e Cannect. Amante de literatura, fotografia e conteúdo de qualidade.
Inscreva-se grátis na nossa Newsletter!
De Cético a Investidor: A jornada de Élber no mercado de cannabis
‘O CBD me trouxe a oportunidade de viver’, diz paciente com fibromialgia
Mãe conta como a cannabis ajudou no autismo ‘foi surpreendente’
‘Uma das melhores experiências que já tive’, diz influencer sobre a cannabis
‘A caixa de remédios continua fechada’, diz paciente com dores crônicas
Empreendedor diz que cannabis ajuda a organizar emoções
Copyright 2019/2023 Cannalize – Todos os direitos reservados
Solicitação de remoção de imagem
Termos e Condições de Uso