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Saúde e Ciência

Tratamento e preconceito: A cannabis baseada em fatos



25/08/2021


Segundo o Dr. Mário Grieco, a falta de acesso à cannabis não está relacionada apenas ao preço, mas também ao preconceito e a falta de informações. 

No finalzinho de 2019 todos comemoraram a aprovação da Resolução 327/19, que autorizou a produção e comercialização de produtos à base de cannabis no Brasil.

Mesmo vetando o cultivo, a RDC era uma esperança para muitas famílias, que só precisariam ter uma receita médica para comprar o óleo de cannabis nas farmácias.

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Facilidade de aprovação

A resolução também prometeu uma facilidade para aprovar os produtos, uma vez que ampliou o leque de produção. Não seria apenas a venda de remédios, mas também de produtos derivados.

Tecnicamente eles ainda seriam medicamentos, mas autorizados aqui sem a necessidade de testes clínicos. Foi criado até uma categoria específica de tratamentos não convencionais chamada “produtos derivados da cannabis”.

Todos tiveram que esperar ansiosamente os três meses para que ela entrasse em vigor, o que aconteceu em março de 2020. Mas o tão prometido “acesso mais fácil à cannabis” só ficou nas expectativas.

Caro e limitado

A primeira empresa a obter o registro foi a Prati-Donaduzzi, um mês depois da resolução entrar em vigor. Contudo, o valor de cada frasco pode chegar a dois salários mínimos. 

Apesar de outras empresas também conseguirem a autorização e prometer um valor inferior (na faixa dos R$300,00), a cannabis ainda continua inacessível para boa parte dos brasileiros. 

Tratamento diferenciado

Mas será que o problema é o valor? Segundo o médico Mário Grieco, há questões muito maiores e muito mais profundas que o preço, como o tipo de tratamento para cada um.

O médico é um dos 20 líderes mais influentes sobre longevidade e recentemente escreveu um livro sobre cannabis medicinal. 

Ele explica que, ao contrário da medicina tradicional, cada tratamento é diferenciado com a planta. Enquanto alguns precisam de mais Canabidiol (CBD), outros necessitam de mais tetraidrocanabinol (THC). O que também pode variar de acordo com a condição tratada. 

“É um tratamento personalizado, cada paciente praticamente toma uma dose única de medicamentos. Primeiro que se começa dando uma dose pequena e se for muito alta, pode passar da janela terapêutica. Isso requer muito acompanhamento, vejo os pacientes semanalmente para ver como eles estão sentindo”, ressalta. 

No Brasil, os produtos à base de cannabis disponíveis nas farmácias possuem concentrações de canabinoides exatas, o que não pode funcionar para todo mundo.

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Mário Grieco

Por isso, muitas recorrem a importações, associações e até ao cultivo ilegal para obter um óleo mais específico para a sua condição médica. 

“Há também alguns pacientes que nem respondem (ao tratamento), pois a cannabis é metabolizada no fígado, onde acontece a ativação. Mas se uma pessoa não tiver uma das enzimas necessárias, ele não vai ter resultados com a cannabis”, ressalta.

Além das expectativas 

Hoje, Mário Grecio tem mais de 1.000 pacientes, e por mais que tenha estudado sobre o tema, a cannabis ainda traz surpresas.  

Nos seus atendimentos, ele chegou a indicar a cannabis para uma determinada queixa, mas o tratamento ajudou em outras patologias. Ele começou a encontrar ações que ainda nem foram descritas. 

“Um paciente me procurou porque tinha muita enxaqueca e disse que notou que antes do tratamento com a cannabis, tinha problemas para urinar, o seu jato era praticamente gotas. Mas hoje ele está urinando normal. Depois eu descobri que existem receptores canabinoides na própria próstata”, relata.

O médico também explica que a cannabis tem a capacidade de aumentar a produção de neurônios, o que pode ser bastante útil para a memória e a criatividade. 

“Mudar a transmissão cerebral entre um neurônio em outro, se transforma em novas vias de transmissão do impulso elétrico e nervoso. Quando o Caetano Veloso e Gilberto Gil se reúnem para fazer uma música, por exemplo, dão uma fumadinha”, diz. 

Preconceito

Outra questão que o médico aponta sobre a falta de acesso à cannabis medicinal, é a ignorância, criada pelo preconceito de anos.

Mário Grieco conta que começou  a entender sobre as propriedades da cannabis lá fora, quando pesquisava sobre farmacogenética. “Tive a capacidade de mudar radicalmente para aprender uma coisa nova, mesmo estando a tantos anos na medicina tradicional”, diz.

Contudo, falar sobre isso no Brasil não foi uma tarefa fácil, ele sempre tinha que explicar sobre como funcionava a terapia canábica. Entre o ceticismo e as críticas, recebeu até acusações de que o seu discurso incentiva adolescentes ao uso da maconha.  

“Ela ficou desacreditada, porque fizeram tantas campanhas discriminativas, mas a cannabis não  é porta de entrada, mas de saída. Várias clínicas usam a cannabis como tratamento para viciados, eles fazem a substituição devagar.”, explica.

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Livro

Uma coisa que ele notou é que seus pacientes com mais de 60 anos, eram sempre levados por seus filhos e netos, pois ainda são menos abertos à terapia canábica. 

Depois que a fama do tratamento à base cannabis foi aumentando, muitos colegas de profissão também começaram a se interessar pelo assunto, buscando Grieco como referência. 

Foi pensando nisso que ele resolveu escrever um livro, chamado “Cannabis Medicinal baseada em fatos”, que chegará ao mercado até outubro.  

O livro, direcionado tanto para  profissionais quanto para leigos, conta a história da planta até o dia de hoje, além de 50 doenças tratáveis com a planta, interações medicamentosas e claro, sobre preconceito.

O médico fez questão de colocar dados e números, para destacar a efetividade da planta.

“Tem certos pacientes que não tem a menor ideia, muitos deles não querem ir por causa do preconceito. O objetivo do livro foi tentar abrir um pouco as portas para o conhecimento, a minha maior contribuição facilitar a compreensão é explicar a ciência baseada em fatos”, conclui. 

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Tainara Cavalcante

Jornalista pela Fapcom (Faculdade Paulus de Comunicação) e pós graduanda na FAAP (Fundação Armando Alves Penteado) em Jornalismo Digital, atua como produtora de conteúdo no Cannalize, Dr. Cannabis e Cannect. Amante de literatura, fotografia e conteúdo de qualidade.