Proposta do Cultivo de Cannabis: Mitos e Verdades

Proposta do Cultivo de Cannabis: Mitos e Verdades

Sobre as colunas

As colunas publicadas na Cannalize não traduzem necessariamente a opinião do portal. A publicação tem o propósito de estimular o debate sobre cannabis no Brasil e no mundo e de refletir sobre diversos pontos de vista sobre o tema.​

O alvoroço sobre o Projeto de lei que visa o cultivo de cannabis no Brasil levantou muitas informações falaciosas ou desconexas. Conversamos com um especialista que nos ajudou a esclarecer algumas dúvidas.

Depois que o Projeto de Lei 399/2015 foi para a câmara dos deputados, o assunto gerou polêmica e dividiu o plenário com apoiadores e contrários.

A proposta foi criticada até pelo presidente Jair Bolsonaro, o Ministério da Justiça e até o Ministério da Mulher, Família e Direitos humanos.

Diante da PL polêmica, também surgiram diversas notícias falsas ou meias verdades, que trouxeram ainda mais divisões não apenas na política, mas para a opinião pública.

Por isso, convidamos o consultor jurídico na área de regulamentação de saúde, inclusive de cannabis, Pedro Gabriel Lopes, que também é co-fundador do Instituto de Pesquisas Sociais e Econômicas (ISPSEC). Ele nos ajudou a esclarecer alguns mitos e verdades sobre a proposta.

Indoor Cannabis plant, branch of marijuana on a pink background

Veja 10 delas:

  1. A PL vai liberar o plantio da maconha

VERDADE. Ela vai liberar o plantio de maconha, mas apenas para pessoas jurídicas. Caso aprovada, o Brasil terá o cultivo de cânhamo e de cannabis medicinal por empresas, que vão pedir autorização para o poder público.

A proposta também contempla o cultivo por associações de pacientes. “É importante ressaltar que a gente não está falando aqui sobre o cultivo de pessoas físicas.” Complementa o consultor jurídico.

  1. A proposta só é apoiada por deputados da esquerda

MITO.  Nos últimos anos é possível enxergar um avanço não só no Brasil, mas no mundo inteiro sobre a cannabis, que engloba tanto políticos da esquerda quanto da direita.

Aqui no Brasil a gente tem deputados que são ligados a partidos que são mais à direita, como o PSDB, que tem deputados que defendem abertamente.

Também alguns casos específicos de defesa do projeto de lei por deputados do Podemos, PTB, que são alinhados à direita.

“Há defensores que até surpreendem, como é o caso do Carla Zambelli que já se posicionou favorável à cannabis medicinal, embora não tenha se mostrado favorável ao projeto de lei em si. Então não dá mais pra falar que este é um projeto que é defendido exclusivamente pela esquerda.” Ressalta.  

  1. A PL pode ajudar a economia

VERDADE. A PL pode ajudar bastante a economia.

Inclusive, ao redor do mundo, vários projetos de lei já foram aprovados com este foco na arrecadação de impostos com a cannabis. Tributos destinados para alguns fins específicos, como educação, por exemplo.

No caso do Brasil, existe uma estimativa de que se for incluir, por exemplo, o tratamento de dor crônica, na possibilidade de prescrição destes medicamentos à base de cannabis, a renda chegaria a um montante de 4,7 bilhões de reais.

O estudo foi feito pela New Frontier Data em parceria com a The Green Hub, um ponto bem importante.

“Ainda assim a gente sempre tem que ver estes dados com cautela, claro, porque a estimativa não significa a concretização. Mas sem dúvida haverá uma melhora na economia.” Complementa o advogado.

  1. A proposta não é voltada apenas para o uso medicinal

VERDADE.  Ela não é voltada apenas para o uso medicinal, ela contemplará também o uso industrial, como é o caso do cânhamo.

Além disso, já no projeto de lei você já tem uma série de indicações de que o uso dermatológico.

A proposta não foca só no uso medicinal, mas também garante o uso industrial, embora você ainda tenha uma restrição muito grande na discussão sobre o uso recreativo.

É importante destacar que o uso recreativo não vai ser contemplado neste projeto de lei.

  1. Todas as associações poderão plantar

VERDADE. As associações vão ter que adequar as aplicações que hoje são feitas às farmácias vivas, uma iniciativa do governo federal para plantas fitoterápicas.

Elas não têm tantas exigências do que seria com uma indústria farmacêutica, mas também estabelece critérios sérios.

  1. A proposta vai facilitar o tráfico

MITO. O projeto de lei fala sobre o cultivo de cânhamo, onde teremos critérios de segurança mais simples, mas o cânhamo não tem efeitos psicoativos.

Contudo a PL também permite o cultivo da cannabis medicinal com maiores quantidades de tetraidrocanabinol (THC) e, portanto, tem efeitos alucinógenos.

Porém os critérios de segurança do cultivo para fins medicinais são bem rígidos, por isso, a possibilidade de que facilite o tráfico é bem difícil.

“Para se ter uma ideia, você terá que estabelecer cotas de quantas plantas irá cultivar e reportar o quanto colheu para o governo. Eu não vejo que não vai facilitar o tráfico.”

Por outro lado, o projeto de lei não pode ser tão rígido, ao ponto de incentivar o tráfico. A gente não pode ter um projeto de lei que desestimule as famílias e associações a recorrerem aos meios legais para garantir o acesso aos seus medicamentos.

Porque se você for estabelecer barreiras já no projeto de lei, que encarecem o produto e dificultem o acesso a medicamentos, isso vai continuar favorecendo o tráfico.

Aí sim a PL favorece o tráfico. A regulamentação que vai surgir depois do projeto de lei ainda é uma dúvida, mas se a gente estabelecer critérios que não viabilizem o acesso a medicamentos, isso sim pode ser um tiro no pé.

  1. A PL vai legalizar a maconha

MITO. A proposta visa legalizar a cannabis para fins medicinais e industriais. O uso recreativo vai continuar proibido.

“Problemas que temos da guerra às drogas ainda vão continuar. É importante ressaltar isso.”

  1. Com o canabidiol no SUS não precisa da PL

MITO. Primeiro porque o canabidiol (CBD) é apenas um dos canabinoides. O próprio THC tem efeitos médicos que são evidenciados ao redor do mundo e que poderiam ser aproveitados também.

E estamos falando só de dois canabinoides. Uma das coisas que é mais importante no uso para fins médicos, é o Efeito Entourage, a associação da maioria dos canabinoides, que acaba gerando um produto melhor, com uma resposta melhor.

Até porque o Sistema Endocanabinoide é como se fosse uma digital, cada um tem a sua. Isso nos mostra que não devemos ter um remédio só.

“Também é importante falar que o canabidiol que está sendo incorporado é o canabidiol da farmacêutica Prati Donaduzzi, que tem uma quantidade específica de CBD. Então não estamos falando de pessoas que precisam de concentrações maiores ou de outros canabinoides.” Ressalta.

Não dá pra falar que com o canabidiol no SUS não precisa da PL, pois além dos efeitos médicos que os outros canabinoides tem, a proposta trata de outros assuntos também, como o uso industrial, dermatológico e afins.

  1. Caso aprovada, o cultivo será feito pela Embrapa

MITO. Pode até ser feito pela Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária), há até algumas propostas neste sentido.

Mas a princípio, o cultivo não será feito só pela Embrapa, mas por pessoas jurídicas que vão cultivar tanto o cânhamo quanto a cannabis para fins medicinais.

“Diante da importância da Embrapa, e até pela tecnologia que ela já tem, seria incrível se a estatal participasse desse processo, até para ajudar os melhoramentos genéticos e também estruturar toda a cadeia.” Comenta o consultor jurídico.

  1. A proposta pode ser votada em breve

NÃO SE SABE. A votação depende de vários fatores. O projeto de lei ficou pautado durante muito tempo na incerteza se seria aprovado ou não.

No começo de setembro de 2020 houve uma expectativa de que pudesse ser aprovado, até porque tinha um acordo com o Rodrigo Maia. Mas a bancada evangélica protestou e barrou os avanços do projeto de lei.

O Projeto de Lei está em uma comissão especial, que pode aprová-lo e ser encaminhado direto para o senado, sem a necessidade de passar pelo plenário.

Só a comissão com os 37 deputados pode decidir se a proposta segue ou não. É claro que ainda assim a PL pode ser levada para a maioria dos deputados do plenário para discussão.

Mas para isso precisa ter uma articulação das pessoas contrárias à comissão especial.

Por isso, ainda que seja votada, não dá para saber o que vai significar. É bem provável que mesmo que aprovada na comissão especial, o projeto ainda tenha que passar pelo plenário para depois ir para o senado.

Outra questão que também deixou o assunto um mistério, é que todas as comissões estão suspensas, devido à pandemia de COVID-19.

Mas isso tudo vai depender de muita coisa, inclusive da eleição do próximo presidente da câmara.

 

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