Depois que o Projeto de Lei 399 foi parar na Câmara dos Deputados, o assunto “cannabis” tem gerado bastante polêmica e dividiu tanto políticos como a população em geral.
Isso porque além do cultivo em solo nacional, que já é um motivo de bastante discussão, o projeto também visa várias concentrações de canabinoides e até outras substâncias da cannabis para fins medicinais, como os flavonoides, terpenos e o temido canabinoide tetraidrocanabinol (THC).
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), o abuso da planta em forma de cigarro pode causar dependência leve ou moderada, e o THC é a molécula responsável por causar o famoso “barato” da maconha.
Por causa disso, este canabinoide é bastante estigmatizado, até na produção de medicamentos. A maioria dos remédios são feitos com o Canabidiol (CBD) puro, ou então com uma quantidade bem pequena de THC.
Tanto que a justificativa principal dos contrários à proposta, como o deputado Osmar Terra (PMDB), é que o CBD é o único componente da planta que pode ser aproveitado. Mas será que é isso mesmo?
Que o canabinoide influencia o cérebro e o Sistema Nervoso Central, isso é um fato. Mas não necessariamente um fato ruim.
Embora também faça parte da cannabis, os canabinoides vão agir de formas diferentes no organismo. O THC, por exemplo, possui propriedades terapêuticas que o CBD não tem.
Sem contar com o famoso efeito sinérgico, que pode acontecer entre ele e outros canabinoides, até mesmo com outras substâncias da planta.
Estas misturas podem potencializar os efeitos da cannabis em até 10 vezes.
Uma das situações em que o THC se sobressai ao CBD, por exemplo, é o alívio das dores. Mais de 1,5 bilhão de pessoas em todo o mundo reclamam de algum tipo de dor crônica.
Segundo a Sociedade Brasileira de Estudos da Dor (SBED),37% da população brasileira sofre de dores crônicas. Isso representa cerca de 60 milhões de brasileiros.
Contudo, já há estudos que mostram que o canabinoide pode ser bastante útil. Em uma revisão sistemática liderada por um pesquisador da Universidade de Harvard em 28 estudos, foi comprovado a eficácia de canabinoides para tratar várias dores e problemas médicos, o autor concluiu:
“O uso de cannabis para tratar as dores crônicas, neuropáticas devido à esclerose múltipla é apoiado por evidência de alta qualidade”.
Dos estudos revisados 6 em 6 sobre dor crônica e 5 em 5 sobre dores neuropáticas estudadas, encontraram uma melhora significativa nos sintomas entre os pacientes.
O Mevatyl, por exemplo, é um remédio feito com bastante THC e é indicado para tratar esclerose múltipla.
Ele foi o primeiro medicamento a ser aprovado no Brasil. Conhecido como Sativex lá fora, também é regulamentado em mais 28 países.
O canabinoide foi de grande ajuda na vida de Gilberto Castro, que luta contra a esclerose múltipla. Já contamos a história dele aqui.
O THC também tem sido de grande ajuda no tratamento contra o câncer. Contudo, o seu papel ainda é secundário. Ele ajuda a evitar náuseas e vômitos causados pela quimioterapia.
Há até um remédio para isso. O Dronabinol, também conhecido como Marinol, é uma versão sintética do tetrahidrocanabinol, que serve para prevenir as náuseas e vômitos que podem ocorrer após o tratamento com medicamentos usados contra cânceres malignos.
Além do mais, há também alguns estudos que mostram que os canabinoides da planta podem matar as células cancerígenas e preservar as células saudáveis. Mas esta já é outra história.
Até hoje, vários estudos clínicos são realizados para testar o tratamento alternativo, e as descobertas são sempre positivas.
Isso porque a cannabis tem propriedades relaxantes e terapêuticas que diminuem o nível de estresse e ansiedade, causas mais frequentes da insônia.
Um estudo publicado no Journal of Psychopharmacology, por exemplo, mostrou que o CBD pode aumentar o tempo do sono e o THC a sua latência.
Já falamos da experiência de vida de Jéssica Soares, que depois de várias tentativas frustradas, a cannabis foi a única solução para que ela pudesse retomar a qualidade de sono.
Para entender como o THC pode ser útil, é necessário compreender que o nosso corpo possui um sistema chamado Sistema Endocanabinoide (SEC). Ele controla a homeostase, ou seja, o equilíbrio de várias funções do corpo, como a fome, o sono e o humor.
Os canais deste sistema estão diretamente ligados ao cérebro, ao Sistema Nervoso Central e também ao Sistema Imunológico. Se alguma parte do corpo não vai bem, é o sistema que avisa o que precisa ser regulado.
Os cientistas acreditam que um evento adverso ou um estresse crônico pode prejudicar a sinalização do sistema. Assim, o cérebro não vê que tem algo de errado.
O SEC funciona com alguns receptores, eles transmitem as informações para as células sobre as mudanças que estão acontecendo. Os mais conhecidos são chamados de CB1 e CB2.
Quando se tem Transtorno de Estresse Pós-Traumático (TEPT), a ativação desses receptores é extremamente útil, uma vez que o Sistema Endocanabinoide desempenha um papel importante na influência do humor e também na construção da memória.
O receptor CB1 é responsável por uma reação chamada “extinction learning”, que permite que novas memórias substituam a antiga. Isso ajuda o corpo a voltar a sentir estímulos que eram evitados, por causar pânico ou sentimentos ruins.
Assim como os canabinoides feitos pelo próprio corpo, os canabinoides da planta podem ser úteis na ativação dos receptores canabinoides.
Talvez você já saiba que a maconha causa fome. Contudo, o que chamamos popularmente de “larica”, é a conexão de algumas moléculas da cannabis com os receptores do apetite do nosso corpo.
Quando a maconha é inalada, por exemplo, o THC se conecta com os receptores do sistema nervoso central, que controlam a fome e o apetite.
O canabinoide também pode desencadear um surto de um hormônio chamado grelina, mais conhecido como hormônio da fome.
O hormônio geralmente é ativado quando o estômago está vazio, enviando uma mensagem para o cérebro dizendo que é hora de comer.
A reação provocada pela larica pode ser usada para estimular a fome em pessoas com condições como AIDS e câncer, por exemplo.
As terapias destas condições podem causar uma série de efeitos colaterais, como falta de apetite ou falta de prazer pela comida. Portanto, a famosa “larica” pode contornar esses efeitos e proporcionar uma melhor alimentação e consequentemente, uma melhor qualidade de vida.
Essa reação também pode ser usada para casos de anorexia, há até um medicamento feito com canabinoides sintéticos indicado para casos assim.
No entanto, é importante destacar que aqui a cannabis não é sempre fumada, mas nestes casos, é optado pelo uso através do óleo e da vaporização.
Recentemente alguns estudos mostraram a ação da cannabis nas tempestades de citocinas, uma reação causada pelo novo Coronavírus nos pulmões.
Não demorou muito para associarem os efeitos da cannabis na asma, que também prejudica os pulmões. Uma das condições crônicas mais comum, atinge cerca de 235 milhões de pessoas no mundo todo, segundo a OMS. Estima-se que, no Brasil, cerca de 3 a 5 % da população sofre com o problema.
Estudos feitos por profissionais sugerem a capacidade do tetrahidrocanabinol de dilatar as passagens respiratórias e inibir a tosse como fatores que o tornam benéfico para alguns pacientes. Além do THC, o CBD também tem seus benefícios diante dessa condição.
Basicamente, o THC relaxa as vias aéreas para permitir um melhor fluxo de oxigênio. Além de vários pontos inflamatórios associados a doenças respiratórias e relaxar os músculos do tórax.
Quando o THC é consumido através de um vaporizador, ele ainda tem efeitos de dilatação brônquica sem a fumaça prejudicial.
Tainara Cavalcante
Jornalista pela Fapcom (Faculdade Paulus de Comunicação) e pós graduanda na FAAP (Fundação Armando Alves Penteado) em Jornalismo Digital, atua como produtora de conteúdo no Cannalize, Dr. Cannabis e Cannect. Amante de literatura, fotografia e conteúdo de qualidade.
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